Casimiro de Abreu escreveu um de seus maiores poemas relembrando sua infância. “Meus oito anos”, de fato, é uma bela poesia, organizada em rimas e versos. Eu, com meus vinte, já não tenho inspiração suficiente para me dedicar à uma poesia de tal porte que escrevia aos meus dezesseis ou dezessete, talvez pelo fato de certo utopismo e sentimentalismo ter ficado para trás, ainda que não o amor por tal arte.
Falar de nossa situação atual de maneira realística é difícil. O primeiro ponto que acho interessante analizar é que quando era adolescente – dezesseis ou dezessete anos – eu queria ter a liberdade de vinte para fazer as coisas que desejava. A diferença é que agora, com vinte, apesar de realmente ter a liberdade para fazê-las, não desejo mais as mesmas coisas que quando tinha aquela idade. Perdi um pouco do projeto que tinha na adolescência para mim, porém criei outros, talvez mais pés-no-chão.
Minha situação como sujeito social se diferenciou. Antes, sentia a necessidade de participar do mundo, mas ainda me sentia marginalizado. Hoje, vejo que sou peça importante, assim como todos os outros, no jogo político em seus diversos níveis. Porém, apesar da importância, vem também a impotência. Para que mais tarde os leitores de meus livros historiográficos ou opiniões políticas não reclamem de um suposto “recalque” para com a juventude: ele existe hoje, já enquanto faço parte dela. A juventude de classe média-instruída que percebo a minha volta é fútil, incapaz de se preocupar com a sociedade e desinteressada aos problemas que os cercam, pensando apenas em seus ipods, roupas de marca e carência afetiva vazia. Gostaria eu que os jovens pelo menos fizessem seu papel de estudantes com algum interesse social, mas nem isso. Poucos estudam de verdade, e quando estudam pensam apenas no próprio umbigo. 68, onde fostes parar?
Saindo da esfera política, entrando na esfera emocional. De fato, minha idéia de amor mudou bastante de quatro anos pra cá. Talvez exatamente por minhas aproximações amorosas, devido à inexperiência e falta de maturidade em tal período, terem sido praticamente traumáticas, hoje eu as evito e quase não as tenho. Sorrio ao congelamento de meu coração como aqueles que corriam aos seus grilhões pensando que era a liberdade. Se prendiam, certamente, mas nos grilhões encontravam, pelo menos, proteção e calma para poder se revolucionar e alcançar uma liberdade plena. Hoje penso que a possibilidade de amar não é, por si só, libertação: muitas vezes é se prender à circunstâncias destrutivas onde, por motivos morais, sociais e específicos, acaba sendo pior que a cadeia: se torna escravidão.
Me tornei seletivo inclusive com amizades. Antes eu era cercado por vários amigos confiáveis, que foram sendo filtrados não pela matiz da confiança, mas sim pela questão de alinhamento subjetivo – muitos não pensavam, de fato, como eu, e a convivência se tornava insuportável. Hoje tenho apenas poucos e bons, por assim dizer. Não me arrependo: felizmente, meus amigos são fiéis, maduros e sinceros comigo.
Sobre minha família, não tenho o que reclamar. Apoiam-me e me guiam pela minha vida, e sempre estão presentes quando preciso.
Finalmente, tenho um trabalho. Não é o que se pode dizer que seja um grande trabalho, que se ganha muito, mas é importante subjetivamente para mim. Além do desenvolvimento profissional, tenho contato com pessoas totalmente diferentes de mim – dou aula num curso Pré-Vestibular Social – que eu tenho a felicidade de ajudar e crescer pessoalmente, a partir de novas experiências.
A sensação de estar “se tornando gente” é intensa em cada segundo da minha vida. Os estudos e o trabalho, em sua intensidade, me consomem e me jogam uma responsabilidade nas costas que as vezes não sei se consigo aguentar. O amor “erótico”, por si só, deixou de ser amor e se tornou, praticamente, somente luxúria, visto que existe, por opção, um bloqueio para uma imersão numa situação de entrega profunda. Digamos que não sei nadar.
Talvez agora, finalmente, seja a hora de ler com atenção o Livro Dois da “Lira dos Vinte Anos”. Há anos atrás, só conseguia ler o Livro Um e o Três, que são de poesias amorosas e utópicas. Agora, meu filho, a realidade se insere na minha vida como fator pulsante e principal, que tenho que lidar a cada momento de maneira ativa, pois se não for assim, me sinto inerte e inútil, para mim e para todos em volta. Cabe a mim fazer o que minha geração não costuma praticar: estudar e tentar entender o mundo, para, pelo menos, tentar transformá-lo, além de me negar a participar dele vivendo em meu umbigo particular – coisa que seria INFINITAMENTE mais fácil. Mas o caminho mais fácil é sempre o pior, e essa classe-média-tola ainda não aprendeu isso. Então, se querem continuar nos seus mundinhos, gastem milhões em ipods e leiam bastante Veja. Eles são imparciais. Para um lado, pelo menos.